quinta-feira, 7 de julho de 2011

Caso Davizinho derruba ministro dos Transportes

(15h30) Na tarde de 24 de junho de 2009, o ministro Alfredo Nascimento recebeu em seu gabinete o deputado Davi Alves da Silva Júnior, então no PDT, para negociar a liberação de obras na rodovia BR- 010. Embora não tenha sido focalizado pelo cinegrafista, o deputado Valdemar Costa Neto também estava no gabinete e participou de toda a conversa.
O diálogo, no gabinete do ministro, mostra Nascimento discutindo a liberação de obras com o deputado Davi Júnior. No primeiro trecho da conversa, o deputado Valdemar Costa Neto conduz a negociação e admite ter feito um acordo prévio com o ministro para a assinatura do projeto. Durante a conversa, Nascimento deixa claro que Davi poderá obter mais recursos do ministério quando deixar o PDT e migrar para o PR.
Ministro Alfredo Nascimento – Já vou logo copiar aqui o pedido dele… Davi Alves da Silva Júnior, BR- 010, construção da travessia urbana…
Deputado Valdemar Costa Neto – … de Imperatriz.
Deputado Davi Alves da Silva Júnior – Imperatriz, acesso a Davinópolis.
Costa Neto – Já começou o projeto,
não é, Davi?
Davi Júnior – Já.
Costa Neto – Já estão contratando, já está na fase final, viu, Alfredo?… Por isso que ele (deputado Davi Júnior) veio aqui te agradecer.
Nascimento – Ah!… É aquele negócio que tu me pediste?
Costa Neto – É, é…
Nascimento – Pra ele? (referindo-se ao deputado Davi Alves)
Costa Neto – É…
Nascimento – Rapaz, tu não tá nem no partido e já tá conseguindo arrancar as coisas daqui, imagina quando estiver no partido! (diz, dirigindo-se ao deputado Davi) (risos).
Na sequência da conversa, o ministro faz uma rápida leitura no texto que libera R$ 1,5 milhão para a obra e demonstra assinar de qualquer jeito o documento indicado por Costa Neto, sem saber do que se trata, nem mesmo em que lugar do Maranhão o projeto será implantado. Quem dispõe de todas as informações é Costa Neto.
Nascimento – … (lendo o documento) informo que está sendo liberado nesta data limite adicional para movimentação do empenho, no valor de um milhão e meio de reais…
Costa Neto – Um milhão e meio, você que liberou.
Nascimento – (ainda lendo o documento) … Ação… estudo de viabilidade e projeto de infra-estrutura de transporte, travessia urbana, na divisa das cidades de Divinópolis e Imperatriz.
Davi Júnior – Davinópolis (corrigindo o nome da cidade maranhanse).
Nascimento – São duas cidades?
Costa Neto – É Davinópolis… “da”…
Davi Júnior – Não, Davinópolis é a entrada, né?… seria a entrada.
Nascimento – São duas cidades?
Davi Júnior – São duas cidades, isso.
Costa Neto – Mas são ligadas?… Não?… não?…é só acesso.
Davi Júnior – É só acesso, é BR
e o acesso… tem aquele bairro, que é o conjunto Vitória, onde… acontece mais acidente é ali.
Nascimento – Porque o acesso a gente só pode fazer até cinco
quilômetros…
Costa Neto – … Mas estão fazendo
o projeto já… Só pega a parte da BR,
não vai entrar na cidade… Isso que você liberou.
No final da conversa, mais uma vez o ministro mostra que não tinha conhecimento sobre a obra que
estava aprovando.
Nascimento – É Davi ou Divinópolis?
Davi Júnior – É Davi… Ah, que botaram Divinópolis aqui (olhando para o documento), é Davi… é Davi mesmo.
Nascimento – Porra, você dono
da cidade?
Costa Neto – É Davi, por causa do nome dele, por causa do pai dele, o pai dele que fez a cidade, o pai dele era deputado federal, Alfredo.
Nascimento – … (observando os documentos) Então Davinópolis e Imperatriz… Mas não são as duas, é só uma.
Costa Neto – É só uma.
Davi Júnior – Isso.
Costa Neto – É que pega só acesso…
Nascimento – É travessia urbana de Imperatriz?
Costa Neto – De Imperatriz.
Em Brasília, as paredes não têm ouvidos, mas há muitas câmeras indiscretas e uma delas gravou uma daquelas conversas armadas para ficar em segredo. São diálogos mantidos durante uma reunião registrada em áudio e vídeo em pleno gabinete do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. O vídeo obtido por ISTOÉ revela como o ministro e presidente do Partido Republicano (PR) usa o dinheiro público para cooptar deputados para a sigla e comprova a atuação do deputado Valdemar Costa Neto – réu no processo do Mensalão acusado de receber R$ 11 milhões do publicitário Marcos Valério – no Ministério dos Transportes, agindo como uma espécie de ministro de fato. E com amplo acesso a um cobiçado orçamento de R$ 21,5 bilhões para 2011.
Participam do encontro o ministro Nascimento, Costa Neto, o deputado Davi Alves da Silva Júnior, na época filiado ao PDT do Maranhão, e um assessor do parlamentar. A reunião é rápida e as imagens se concentram na mesa da sala de reuniões do gabinete do ministro, onde estão sentados Nascimento e Davi Júnior. Na conversa, o ministro custa a entender o pedido formulado pelo parlamentar para obras na rodovia BR-010, no Maranhão, até que pergunta a Costa Neto: “Ah! É aquele negócio que tu me pediste?” Confirmada a transação, o ministro comenta com Davi: “Rapaz, tu não tá nem no partido e já tá conseguindo arrancar as coisas daqui. Imagina quando estiver no partido!”. Na sequência da declaração nada republicana, Nascimento e Costa Neto soltam uma sonora gargalhada. E, mais tarde, Davi Júnior vai de fato parar nas fileiras do PR e é agraciado com mais liberações milionárias pelo ministro.
O encontro aconteceu na tarde de 24 de junho de 2009. Na conversa, mantida na mesa de reuniões do gabinete do ministro, ficou acertada a liberação para o deputado de R$ 1,5 milhão para o projeto da travessia urbana de Imperatriz, sua base eleitoral. A obra estava orçada em R$ 86 milhões. Na época, o encontro do deputado com o ministro chegou a ser divulgado, mas nenhuma providência foi tomada e a dupla Nascimento e Costa Neto continuou a agir com o apoio dos cofres do Ministério dos Transportes. Hoje, a obra na BR-010 é estimada pelo próprio deputado Davi Júnior em R$ 192 milhões. Obedecendo ao roteiro traçado por Costa Neto e declarado pelo ministro no vídeo, Davi, menos de dois meses depois de sacramentado o negócio, mais precisamente em 19 de agosto daquele ano, apresentou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o pedido de desfiliação do PDT e, em seguida, subscreveu a ficha de ingresso no PR. Levantamento feito por ISTOÉ mostra que a migração partidária trouxe novos e imediatos benefícios ao deputado, como se a transferência de partido tivesse gerado uma fatura a ser paga. Em setembro daquele ano, Davi Júnior conseguiu a liberação de recursos para outra obra vinculada aos Transportes. Dessa vez, com orçamento de R$ 340 milhões.
As cenas que mergulham Nascimento ainda mais no lamaçal da corrupção dos Transportes deixam claro o uso do dinheiro público para angariar correligionários. Mostram ainda que o deputado mensaleiro atua como uma eminência parda, indicando o que o ministro deve assinar para beneficiar seus aliados. É Costa Neto quem alicia o parlamentar, tem autorização para despachar de dentro do gabinete do ministro e orienta, quase determina, para onde vai e quando a verba será liberada. Logo no início do vídeo, Nascimento comenta: “Já vou copiar o pedido. Construção da travessia urbana…” É interrompido por Costa Neto, que não aparece na imagem (a pedido de ISTOÉ, uma perícia confirmou que a voz ouvida ao fundo é de Costa Neto – leia quadro na pág. 41). “…de Imperatriz”, completa, ansioso. Ele avisa, num tom bastante íntimo, que a obra já está sendo contratada. “Está na fase final, viu, Alfredo? Por isso ele (o deputado Davi Júnior) veio aqui te agradecer.” O ministro demonstra que tinha conhecimento prévio do pedido feito pelo chefe do partido ao indagar a Costa Neto se ele se referia “àquele negócio” acertado antes. Diante da confirmação, Nascimento vira-se de volta para o visitante e faz o comentário no qual lembra que o parlamentar vai ser ainda mais bem atendido depois de entrar no partido. No encerramento da conversa informal, diz que Davi Júnior vai receber um comunicado do ministério sobre a liberação.
Os interesses de Valdemar e Davi Júnior se cruzaram em 2009, quando os partidos já se preparavam para o embate eleitoral do ano seguinte. Davi, filiado ao PDT, tentava havia dois anos a execução de uma emenda individual de R$ 800 mil para o projeto de uma obra no seu principal reduto eleitoral, a construção da travessia urbana de Imperatriz e Davinópolis. Costa Neto andava atrás de deputados de outros partidos para ampliar a sua bancada até a data-limite para a troca de legenda, no início de outubro. O mensaleiro, ex-presidente e agora secretário-geral do PR, tratou de chamar o deputado trabalhista para o seu ninho. Para atraí-lo, prometeu ajudar na liberação da verba para a obra tão desejada. O orçamento ficaria em torno de R$ 86 milhões. Antes de marcar a audiência no Ministério dos Transportes, adiantou e negociou o pedido com o amigo ministro, Alfredo Nascimento.
Filho do ex-deputado e ex-prefeito de Imperatriz Davi Alves, assassinado em 1998, Davi Júnior deseja seguir o caminho do pai, que deu nome à cidade de Davinópolis. As conquistas do herdeiro político do ex-prefeito são divulgadas com orgulho. Em agosto do ano passado, o seu informativo na internet anunciou: “Tudo pronto para o início das obras de revitalização da BR-010.” O texto explica que se trata da travessia urbana de Imperatriz até Davinópolis. “A obra está orçada em R$ 192 milhões”, informa o boletim, revelando um sobrepreço de R$ 106 milhões em relação ao projeto inicial. Em setembro de 2009, Davi informa que, na reunião em que tratou da travessia urbana de Imperatriz, questionou o ministro sobre o motivo da paralisação do projeto da travessia de Santa Luzia, Buriticupu e Bom Jesus das Selvas pela BR-222. “O ministro convocou o deputado Davi para reunião e confirmou que o projeto seria atualizado imediatamente e licitado pelo DNIT em dois lotes”, diz a nota. Um lote teria início em fevereiro e outro em julho de 2010. O gabinete do deputado informou na última terça-feira 5 que a obra já está em andamento e terá um custo de R$ 340 milhões.
A ação dos dirigentes do PR dentro do Ministério dos Transportes não é inédita e também não se encerra neste episódio. Em março de 2007, reportagem da ISTOÉ revelou um esquema de aliciamento de oito deputados que disseram ter recebido propostas para se filiar ao PR em troca de cargos e obras do Ministério comandado por Alfredo Nascimento. Líderes do PFL, do PSDB e do PPS afirmaram ter ouvido relatos de deputados que foram sondados para se filiar ao partido, por Nascimento ou seus emissários. Quem abordava os deputados era o então líder do PR na Câmara, Luciano Castro (RR). A conversa se iniciava sempre com o argumento de que deputado de Estado pobre não pode ser de oposição porque precisa de recursos federais para as suas regiões ou não se reelege. Aí, era oferecida a possibilidade de indicar cargos e liberar recursos orçamentários nas áreas ligadas ao Ministério dos Transportes. Seis deputados receberam a oferta de ganhar o poder sobre o escritório local do DNIT, órgão responsável pela construção e manutenção das rodovias federais. O deputado Márcio Junqueira (PFL-RR) contou que teve dois encontros com Nascimento. Disse que, nessas conversas, Nascimento lhe prometeu a liberação de emendas de obras rodoviárias. O PR saíra das urnas com 23 deputados em 2006, mas já tinha 38 em março 2007. Agora com maior rigor para o troca-troca partidário, o PR mantém 40 deputados desde as eleições do ano passado

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