Quando a gente vê alguém levantar as mãos, logo pensa que está se rendendo. Não foi isso ontem, na porta das siderúrgicas de Piquiá de Baixo, profundo interior do Maranhão.
Cerca de cem pessoas estavam de mãos levantadas e sujas,
parando os caminhões de carvão e minério de ferro que queriam entrar,
para alimentar a fome incandescente dos fornos das guseiras.
Eram
jovens de Parauapebas, Marabá, Canaã dos Carajás, Açailândia, Bom Jesus
das Selvas, Buriticupu. Eram idosos e doentes do Piquiá, gritando de
novo com voz humilde e cansada, mas firme, contra aquela poluição que
respiram a cada dia.
Juventudes e comunidades atingidas pela mineração e sua cadeia produtiva estavam encerrando mais um encontro regional de estudo.
Os
moradores levaram um saco do pó preto que cai dia e noite dentro de
suas casas; os jovens sujaram as mãos e as levantaram, envergonhados e
solidários, em denúncia. Tem gestos que falam mesmo com seu silencio:
dezenas de jovens, idosos e crianças mostrando suas mãos e esbarrando o
caminho.
Era um basta à violência ambiental, um bloqueio ao fluxo agressivo do lucro, que passa por cima de direitos e vidas.
Lembro
de um gesto desse tipo mais de dez anos atrás, no grande encontro dos
G8 em Genova, na Itália. Manifestantes levantavam suas mãos, pintadas de
branco, para bloquear as incursões violentas da polícia e dosblack-blocks terroristas. Hoje é outra violência, igualmente mortal, que nos obriga a sujar as mãos de pó preto.
Uma
das estratégias da luta não-violenta é envergonhar publicamente o
adversário. Eu senti vergonha, ontem, quando um morador do bairro
poluído, em sua simplicidade, desabafava no microfone: “a gente pede
justiça às siderúrgicas e elas dizem que precisa falar com a Vale; a
gente denuncia a Vale e ela diz que a responsabilidade é das
siderúrgicas... vai ver que agora os culpados de tudo isso somos nós!”
Com
certeza, de hoje para frente, muito mais pessoas assumiram essa causa.
Uma voz, cantando ao longo do ato, perguntava: “Quem é você?”. E dezenas
de jovens, crianças e outros moradores gritavam em resposta: “Sou
Piquiá!”.
Somos
todos Piquiá, de mãos levantadas, não para nos render, mas em denúncia,
pedindo respeito, exigindo que a corrida louca do progresso pare para
nos escutar!
padre Dário Bossi
Missionário Comboniano e pároco em Açailândia
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